O lábio inferior parecia inchado. As pálpebras morenas eram cortinas irreverentes e transformavam o espetáculo dos olhos numa dramática ópera; uma representação consciente do suspense que causava enquanto se mostrassem entreabertas. O murmúrio denso oscilava entre um…
contínuo sussurro e alguns espasmos agonizantes que pareciam dor. Era coisa exagerada, como refém que usa sua derradeira força na última tentativa de fuga. Em transe, maltratava os seios com murros fortes, de pulsos cerrados, ao passo que balbuciava uma fadiga. Xangô reconheceu o batuque e fez saber seu contentamento no orgasmo espiritual que extraiu mais um grunhido e a fez cair leve e desfalecida. Um belo gèlè, último pedaço seu a tocar a terra seca, fez levantar a poeira emitindo um som oco. Os tambores ainda roncavam quando outras duas senhoras de semblantes sonolentos sentaram-se perto abanando-a. Numa cômoda em mogno, corroída pelo cupim, logo ali próxima da porta, o celular tocou. Ela levantou depressa… e atendeu.
*Originalmente publicado na coluna “conto… ou não conto?”, do jornal Taperá, em 15 de junho de 2013.