– Ou cê entra agora ou chamo o Olavo! Tá achando que o mundo gira ao seu redor?! Quem cê pensa que é?! Acorda nina! Tá achando que vo ficá aqui brincando de boa pessoa?! Cê tem que saber seu lugar! Cansei de você! Sua loca maldita! Juro que te coloco sozinha no escuro! Sua retardada idiota! Vâmo! Vâmo! Vâmo!
A mulher, com fala ininterrupta, mexia desesperadamente a cabeça caminhando de um lado a outro em insultos que a faziam vermelha em todo o rosto. O cabelo mexia pouco, a mão tremia muito e seu tronco agora estava levemente inclinado para frente.
– Vâmo, nina filha da puta! Odeio esse emprego maldito! Cê sabia que foi deixada aqui sem roupa?! – e terminou resmungando – Favelada maldita!
Sueli observava silenciosa, o timbre de voz exagerado e o brinco pequeno na orelha grande da velha magrela. Era um brinco azul brilhante de provável pouco valor.
– Tudo bem! Cê num tem jeito mesmo! Depois o Olavo vem ti pegá sua gorda maldita!
E desta feita Sueli a viu, indo embora arrastando uma das pernas e mexendo a cabeça incessantemente dum lado ao outro, até quando as vistas pouco favoreciam. Sueli retomou para divagar sozinha sobre sua vida. Divagar sobre suas próximas horas. Mas é interrompida novamente, desta vez por um homem negro, alto, fala mansa e sensatez muito aparente:
– Olá Sueli, o carro te espera.
Esse homem tem celular na cintura e um braço bem gordo. Pega Sueli pelo braço levantando-a do banco cinza e fazendo abraçá-lo. E o homem continua, fluente, seu solilóquio, ajudando numa direção contínua que parece já conhecida. Um corredor longo, apertado, sujo, abafado, azul bem clarinho, fétido, noutra parte cinza quase esverdeado, sufocante, negro. Negro.
– Daqui a pouco estamos chegando em sua casa pra senhora se adequar, pois tens uma reunião marcada para daqui duas horas com o grupo turco… Ah! O Caio já foi pro colégio, a Júlia não chegou em casa ainda e o Seu Cláudio ligou avisando que volta daqui três dias… O doutor Gretcher também ligou pra comunicar sua ausência na reunião com os turcos… Estamos a cinco dias da visita do seu pai… Quando for compl…
Sueli adormece cansada num encosto pra cabeça de passageiro.