A Teoria do Carro Vermelho

Quantos carros vermelho você viu hoje? Ok. Tudo bem. Não tem nada de errado com você. Conheça a Teoria do Carro Vermelho e como ela está conectada com seus insucessos.

Há mais de 1 ano apresentei o Google Drive para um cliente mostrando as vantagens do gerenciamento em nuvem, etc.. Fui ignorado.

Semana passada ele correu no caixa da empresa, não achou dinheiro, entrou em pânico e me chamou. Mostrei diversas alternativas que já havia mostrado anteriormente e passei “por cima” no tema do Google Drive; o cliente brilhou os olhos como se nunca tivesse visto. Pediu para implantar imediatamente.

Há cerca de 2 anos, habilitei um outro cliente para anúncios no Google. Geramos os primeiros resultados, apresentei os relatórios, as conversões e orientei largamente sobre a importância de trackear internamente para saber como o “dinheiro digital” se transformou em “dinheiro no caixa”, pois se tratava de um serviço e não um produto em ecommerce ou infoproduto que você mede a venda no ambiente digital.

Como não conseguiram acompanhar e nem compreender o alcance, interromperam o processo e não quiseram mais falar sobre o tema. Não enxergaram o ROI.

Mas, com o hype da inteligência artificial mais alto que o da paleta mexicana no verão de 2013 da Faria Lima, oportunistas brotam do chão e eles não passariam ilesos: ofereceram a mesma coisa que havíamos feito há 2 anos atrás, mas agora com um nome gourmet, que é “tráfego pago”, e pintando a complexidade do leilão de palavras-chave, machine learning, etc.. Adivinhe!? O meu cliente ficou encantado!

Então fui mostrar o que faço do tal “tráfego pago” com outros clientes meus; visão geral, relatórios e possibilidades. Quando exibi um relatório de chamadas telefônicas recebidas que mostra até o número de celular da pessoa que ligou, ele ficou espantado! Então, com um pouco de sarcasmo e algumas piadinhas, fui mostrar tudo o que havíamos feito no passado como se fosse uma novidade.

Mas o que teria acontecido com essas pessoas na jornada empreendedora? Porque não conseguem destravar ações? Qual a matriz da cegueira?

É sintomático. Dá para entender e evitar essa perda conhecendo a teoria do carro vermelho.

A Teoria do Carro Vermelho

Quantos carros vermelho você viu hoje? É provável que você tenha dificuldade de rastrear na memória ou pode até afirmar que não viu nenhum.

Ok. Tudo bem. Não tem nada de errado com você. Agora, se a gente combinar que você ganhará R$ 1.000 por cada carro vermelho que ver ocasionalmente e me enviar uma foto, isso fatalmente mudará a perspectiva e te “abrirá os olhos” para muitos carros vermelhos.

A atenção seletiva é a capacidade da pessoa focar em um estímulo específico enquanto ignora outros. Festinger (1962), em sua teoria da dissonância cognitiva, sugere que as pessoas buscam informações que se alinhem com suas crenças, reduzindo a dissonância entre suas ações e pensamentos. Ele sugere que esse é um mecanismo de defesa que nos ajuda a evitar o desconforto psicológico que surge ao confrontar informações contraditórias.

O viés de confirmação, por sua vez, conforme detalhado por Nickerson (1998), é a tendência de procurar, interpretar e lembrar informações que confirmem nossas crenças, ignorando as contrárias.

Esse viés foi inicialmente observado por Peter Wason na década de 1960, através de experimentos que mostravam como as pessoas preferem informações que validem suas hipóteses, negligenciando dados contraditórios. Esse fenômeno é um componente central na formação e manutenção de crenças individuais e coletivas.

A Teoria do Carro Vermelho é uma ilustração popular dessas duas ideias. Quando você se concentra em um carro vermelho, começa a notar mais carros vermelhos ao seu redor. Isso não significa que tudo era uma “pegadinha do Gugu” e agora soltaram mais carros vermelhos nas ruas. 

É a sua atenção seletiva realçando esses veículos, enquanto seu viés de confirmação reforça a percepção de que os carros vermelhos são mais comuns do que realmente são.

É um Mecanismo de Defesa; Controle-o!

Sim, a atenção seletiva e o viés de confirmação podem ser vistos como mecanismos de defesa do nosso aparato neurológico. Esses dois gatilhos juntos nos ajudam a filtrar a enorme quantidade de informações que recebemos diariamente, permitindo que nos concentremos em dados que são mais relevantes ou menos conflitantes com nossas crenças predefinidas, o que pode reduzir o estresse cognitivo.

Esses processos adaptativos são fundamentais para a nossa capacidade de funcionar eficazmente em um ambiente complexo e frequentemente incerto, ao mesmo tempo em que protegem nossa estabilidade mental.

Mas também podem te prejudicar em alguns contextos, seja te vulnerabilizando quando alguém sabe desarmá-los lhe empurrando algo de que não precisa; ou quando você precisa, mas permeado de preconceitos vai bloquear sua mente com a famosa janela killer da programação neurolinguística e te atrasar.

Receita Para Não Perder Boas Oportunidades

1- Parta sempre do pressuposto que você não sabe com quem vai falar. Mesmo que você já conheça, exercite agir como se não conhecesse.

2- Só entre em reuniões e diálogos que de fato você poderá contribuir absorvendo.

3- Quando você decidir ouvir alguém, concentre-se no diálogo. Caso você não tenha contexto, seja transparente e peça. Caso esteja se percebendo perdendo o interesse, pergunte “por que” e “como”; são gatilhos para quem quer convencer outras pessoas.

4- Mantenha-se “em dia” com as tendências do mercado e novas tecnologias, pois isso ajudará a reconhecer oportunidades genuínas.

5- Esteja disponível para reconsiderar crenças e suposições. Será que você está ignorando evidências contrárias que poderiam ser úteis?

6- Patrocine uma cultura onde questionar e aprender são valores. Isso reduz a resistência a novas ideias e aumenta a sua própria flexibilidade cognitiva.

7- Mantenha um registro das suas decisões e as razões por trás delas. Revise periodicamente para identificar porque você fez aquilo e ajustar suas abordagens futuras.

Ou seja, tanta coisa por fazer no básico…

… Mas o mundo inteiro tá correndo na direção da Inteligência Artificial.

Referências

FESTINGER, L. Uma teoria da dissonância cognitiva. 2. ed. Stanford: Stanford University Press, 1962.

KLAPPER, J. T. Os efeitos da comunicação de massa. Glencoe: The Free Press, 1960.

NICKERSON, R. S. Confirmation bias: A ubiquitous phenomenon in many guises. Review of General Psychology, v. 2, n. 2, p. 175-220, 1998. Disponível em: https://doi.org/10.1037/1089-2680.2.2.175. Acesso em: 22 jul. 2024.

WASON, P. C. On the failure to eliminate hypotheses in a conceptual task. Quarterly Journal of Experimental Psychology, v. 12, n. 3, p. 129-140, 1960. Disponível em: https://doi.org/10.1080/17470216008416717. Acesso em: 22 jul. 2024.