Faz alguns dias, uma gata gorda e folgada trouxe à luz, em meio a um estardalhaço que acendeu lâmpada em toda a vizinhança, dois gatinhos. Bom, em hora achávamos tratar-se de dois. Depois, passada a confusão com as cores, descobrimos que habitavam a garagem de casa, em verdade, quatro gatinhos. Eram brancos, cinza e negro. Mas à noite eram todos pardos, barulhentos e destemidos.
Acreditem vocês que em uma noite saí de meu quarto, nos fundos da casa, para beber água gelada já que ainda não tive audácia financeira de comprar um frigobarzinho e, quando abri a porta da cozinha para ser invadida de madrugada sem luz, um ser de velocidade impressionante reinventou o caminho para as Índias entre meus pés. Era um dos gatinhos que esteve bem confortável, montado sobre densa pelagem na pata, jantando metade de um bife de alcatra. Aquele bife havia sido meu. Eu não tinha conseguido comer ele todo, mas era meu!
Noutra feita tropecei num deles quando saía da cozinha rumo ao meu amado ócio e, confesso, várias vezes me assustei com esses projetos de arruaceiros noturnos. Então fui buscar informações e descobri que eles podem viver até vinte anos, mas que o humano já conheceu um gato com trinta e dois anos. No entanto, essa expectativa de vida está relacionada, óbvio, com o comportamento do gato. Esses desordeiros livres da madrugada que afanam seu sono terão, em média, apenas dois anos de vida, segundo biólogos do site osgatos.com… Ou menos!
No entanto, em casa, eles tinham agora nem vinte centímetros de comprimento. Eram magros, rápidos e planejavam trazer outros gatos para aquela confortável habitação, como de fato notamos, mais tarde, um gato maior e diferente jantando sorrateiramente. Sim, pois o serviço estava especializando-se. Meu pai agora preparava, todas as manhãs, numa tampa velha de uma vasilha, alguns deliciosos pãezinhos mergulhados em leite longa vida. Havia água em um recipiente maior, trocada de uma em uma hora; o calor era intenso. No almoço a elegância reservava pedaços grandes de carne perdidos em arroz arbóreo. À noite se repetia esse cardápio com uma larga dose de atenção, carinho e orgulho por parte de alguns que já estavam, inclusive, a expor os gatinhos como novos membros de nossa constituída família.
Assisti adultos barbados e senhoras distintas perderem a sensatez. Era um tal de “cute, cute, cute… vem papá vem pletinho!”; “mô fofinho… cadê o blanquinho hein?”. Existiu todo tipo de exclamação: Nhá! Unhé! Anhiii! E, num misto riso e incompreensão do absurdo, a minha exclamação: Méodeus!
Dessa forma, acabei decidido que eles estavam dominando o espaço. O meu espaço! Então me organizei com meus devaneios e botei gás em minha chapa “diga não aos gatos”. Atormentei vários amigos especulando uma maneira de me livrar deles de forma branca. Surgiram muitas opções. A chapa estava funcionando, pois agora eu tinha outro filiado: meu irmão que fora censurado quando quis trazer em casa um peludo poodle.
A insanidade estava invadindo minha vida que comecei a organizar um reality show aonde acabei por fazer vários longos vídeos. Com direito a produção do tipo: “vou jogar um limão pra ver a reação deles”. E depois delirava com a exibição na tela do computador, agora para uma platéia maior e perdida em admiração. Foi quando me peguei com o rosto de sobrancelhas caídas e com a cabeça levemente inclinada para a esquerda; estava perdidamente apaixonado por aqueles peludos folgados!
Ontem o Centro de Controle de Zoonoses veio buscá-los.