Duas mulheres*

Tinha dentes largos e separados. Sentava sempre no mesmo banco, às 13h10. Todos os dias no mesmo lugar. Todos os dias da semana. Era de levantar a barra do vestido até os joelhos para ventilar as pernas. Os meninos, ali na quadra, faziam um chute leve aproximar a bola para, quem sabe, tê-la desprotegida. Porém, ela abaixava a saia com urgência e lançava a bola de volta, com certa sofreguidão, antes que se aproximassem. Eram tantos os chutes que ela percebera a intenção curiosa dos meninos, mas não deixaria o lugar conquistado há anos com silêncio e persistência. Era caso de quando ocupado, o banco, ela se plantar em pé ao lado do incauto, e ficar até incomodar. Bastavam uns minutos e ela sentava absoluta. Sempre presa em vestidos longos, de cores escuras e sem estampas, sentava com o mesmo coque pequeno, de rosto baixo e mãos rápidas beliscando o lábio inferior. Levantava cerca de quinze minutos depois para voltar ao trabalho. À noite era mulher seminua na rua do Teatro Giuseppe Verdi.

*Primeira coluna “conto… ou não conto?”, publicada no jornal Taperá (Salto-Itu-Indaiatuba), em 1 de junho de 2013.