Aguardava mais um grupo de crianças. Seria o terceiro e penúltimo grupo de crianças. Embora eu tenha comigo uma sensação estranha de que em verdade aqueles sim deviam ser passarinhos; eles andam se disfarçando de criança. Sim, pois com os avanços não é nada duvidoso que seja possível.
Mas não me deixei ser comido pelos meus pensamentos furtivos e perturbadores. Tinha o meu pé coberto de palha e folhas secas de bananeira. Numa última averiguação, atento-me para a possibilidade de estar com a braguilha aberta, muito comum quando se trata de uma calça xadrez opaco, envelhecida e abandonada pelo dono da fazenda. Apanho a vassoura, estico o braço esquerdo e acompanhando com o direito prezo a posição consagrada e cansativa do espantalho crucificado; o altivo fiel e pai defensor, o guardador das folhas, o esquecido protetor das hortaliças.
Eles chegam em silêncio como que prevendo meu súbito despertar, organizam-se no silêncio dos malfeitores. Um silêncio próprio das más intenções, pois que eles vivem as primeiras experiências barrocas do estar humano, num querer tocar o ser estranho, mas temer sua demência. Eu finjo meus sonhos, eu engano meu ronco, minto meu sono, mas não disfarço meu delírio; estou com náuseas talvez, ou enjôo, ou ainda um misto disso, não sei…
Desmaio.
Permaneci, segundo amigos próximos, cerca de 30 segundos desacordado, e não vou negar que foi uma experiência incrível. Durante 30 segundos devo ter descansado cerca de 37 horas. Foram 30 segundos que me levou a cavalgues numa história sem fim de brotar inveja em Bastian Balthazar Bux. Tudo de tamanha intensidade que me deixou torpe quando voltei.
E voltei.
Voltei com uma tremedeira incontrolável e lapsos de palavras, pois ainda pensava na intensidade de tudo aquilo que acabara de acontecer. Pensava na maneira como me levantei. Pensava na maneira como tudo ficou tão comum e sem importância. Devaneei todos me olhando sem imaginar o surto surreal que acabara de vivenciar; minha fantasia mais real. Mas acabou que voltei. Voltei foi mesmo com mais vontade de quebrar termômetro pra observar o mercúrio segregado, das vezes que pegava um palito de dente pra movimenta-los no propósito inconsequente de querer unir em mesma matéria. Voltei foi numa vontade cozida e insana de abandonar projetos desgastantes, ignorar amigos contraditórios e deixar pessoas desagradáveis falando sozinhas. Não sou vilão, mas eu voltei e gosto da idéia de estar aqui ainda. Voltei assim meio sem medo de muita coisa.