Privacidade na sociedade do avatar

As últimas pessoas que se interessam pela privacidade nasceram no fim do século XX. Os nativos digitais deste século não dão a menor bola para seus próprios limites. Parecem não ter limites ou critérios bem definidos. Não contam para a família onde estiveram de fato, mas fazem check-in no Foursquare; fotografam seu animal de estimação que acabou de morrer e publicam no Twitter; avisam, no Facebook, que vão viajar com a família toda e a casa ficará vazia; dentre outras coisas. Parecem gostar da realityzação.

Por isso, Obama e suas bisbilhotices não assustam essa turma. Edward Snowden, de longe aparece herói para eles. Está mais para um poser buscando likes e acreditam que faz, assim como eles, de tudo para aumentar a rede de “amigos”. Eles riem do pânico instalado nos reacionários de plantão que se chocaram com a bomba do jornal O Globo deste domingo, que
pautou a imprensa na América Latina, sobre a descarada espionagem estadunidense de milhares de emails e telefonemas de brasileiros.

Sabe a Síndrome de Mogli, o menino lobo? Pois bem, é isso. Essa galera nasceu no berço da Internet e descarta, dentre outras coisas, que a rede mundial de computadores não seja gratuita, tampouco segura. Só quando briga com o namorado, a garota pensa em praticar o veto de seu conteúdo nas redes sociais. Mas ela não se importa em comprar na web, conhecer outras pessoas ou seguir publicações que revelem suas pretensões. A crença perene é a de que nada ali oferece perigo.

Para eles a questão da privacidade não tem nenhuma relevância pois, simplesmente, não reconhecem a palavra “privacidade”. Acreditam, piamente, que o “control+Z” resolva qualquer problema e deixam por conta dos outros as “marcações em fotos”, por exemplo. E assim, muito curiosamente, fortalecem a rede de referências, afinal, mamães continuam repetindo “não converse com estranhos, hein!”

Mas fica a pergunta: quem é estranho? Na sociedade dos avatares imortais, quem você conhece de verdade? Quem fala a verdade? Há quem estude os complexos bancos de dados que são capazes de traçar o perfil de alguém somente linearizando seu comportamento digital. Mas esses dados falam a verdade?

Ironicamente, esses nativos digitais que ignoram a semântica dessa privacidade que sequestrou o avião de Evo Morales, estão protegidos, pois entregam somente seus avatares para o sistema.