– A padaria vai abrir em alguns minutos, cara.- Legal, valeu!Espero alguns minutos e tento descobrir qual a razão que me levou à padaria antes dela abrir. Isso significa que eu estava na “porta de bar”, da padaria, às três e meia da manhã! Faço retrospectiva racional e não descubro muita coisa. Tento uma observação estelar e isso não me fez sentir-se estrela. Como isso acontece?!Vamos parar numa infinidade de lugares por um outro tanto grande de motivos. Abstrato!Opto por um cigarro, mas lembro a tempo, que não fumo: “fuja do primeiro trago”. Começo a sentir o gosto dos comercias de cigarro, o vento frio, o cheiro do café, a fumaçinha da respiração achando lugar entre as mãos protegidas com luva de vovó, a saliva seca e, lembrando em tempo… não fumo. Que pena! Um cigarro calharia acontecer como perfeição. Desisto. Conto números desconexos quando ouço o barulho da “porta de bar”, da padaria, poluir sonoramente uma vila toda. Assustei percebendo que se tratava de um funcionário insatisfeito e ignorei com um olhar distante, como se não tivesse sequer ouvido o ruído, e tampouco tinha a intenção de entrar naquela padaria medíocre, nojenta e burra que dispõe, lado a lado numa mesma prateleira, o shampoo e o molho shoyo, seu irmão sanitário. Mas nunca que entraria nessa padaria de velhos grosseiros tomando um “pingado”! Essa padaria tosca que a mulher do caixa tem cara de quem levou surra de chinelo havaianas usado, a noite toda. Nunca mesmo!Olho de um lado ao outro da rua… Como se fosse passar algum carro tamanha madrugada! O jornaleiro está abrindo sua banca e então decido, como tirano do meu próprio nariz, que sabia onde queria ir. Eu sabia exatamente o que estava fazendo ali às três e meia da madrugada. Eu sou mais eu!Olho de novo e agora, quarenta minutos depois, um farol aponta longe. Aproxima-se como quem acabou de comer muito e está cansado. Vem com velocidade tão intensa que chega a tremer os vidros da perfumaria que estou encostado. Passa.Olho novamente e agora nada me impedia de fazer o que realmente queria. Ninguém podia impedir minha personalidade. Atravesso a rua e quando chego à outra calçada esbarro saindo da padaria, Vagner da Silva, amigo de escola que deixou os anos corroerem seus dentes. Conversamos palavras rápidas, toscas e desnecessárias do tipo:- E aê Alex, tudo bem com você cara?!- Tudo bem sim- Mas e aê, trabalhando?!- É, to trabalhando com turismo agora…- Que loco meu!- …- Bom, vou nessa aê Alex. To indo trampar. Pego o busão aê na frente.- Firmeza Vagnão, a gente se vê.- Falou!Olho Vagner se afastar ainda embriagado com abordagem tão insensível que despendi por considerar esses encontros casuais deveras desagradáveis. Penso nas infinitas calçadas que troquei pra não ter que conversar palavras frias e falsas. Penso em desculpas cabíveis e santas sobre meu astigmatismo, ou sobre um compromisso atrasado. Escapar de papo chato tem preço.Lembro dos dias frios que fiquei cortando vento gelado no rosto porque não sabia me livrar do papo, embora rápido, incessante que ia desde pouco cabelo até….- Pois não?!- Um “pingado”, por favor… Ah! Pode ser uma “média”… Obrigado!