Recentemente chegou um cachorro em casa. Chegou com a pecha do conflito. Tão pequeno e silencioso; tão sensível e inofensivo. Nem latia. “Estranho um cachorro que não late”. É que há tanto que não acompanhava um filhote que minha memória havia enrijecido.
Tive dois cachorros que cresceram comigo e conviviam, na maioria das vezes, harmoniosamente. O Pingo chegou primeiro, um fox paulistinha que dormia uma noite inteira na gandaia e voltava marrom, e o Panther, um mestiço de pastor alemão capa preta. Este último, ainda na adolescência, quando saiu uma única vez na rua, viveu sua mais traumatizante experiência; quase foi atropelado por um ônibus. Nunca mais!
Ando propagando a importância de um cachorro na vida de uma criança, para ela entender a morte, mas recentemente outro detalhe me despertou. O pet business está cada vez mais
especializado e envolve inúmeros nichos. Conheci, há pouco, um casal especialista em mini-porcos e dezenas de pessoas que criam mini-caprinos dentro de casa. Mas isso era só a isca do meu raciocínio.
Quando você conversa com essas pessoas, quase não entende a relação de dependência entre elas e seus animais de estimação. Levam a vida em torno deles. Fazem escolhas em função deles. Passam mal por eles. Irritam-se por eles e, inclusive, votam em quem os protejam.
Há mais de uma década, quando encontrei o Pingo mortendurecido no quintal de casa, essa indústria era minúscula e os animais de estimação eram apenas isso; animais. As pessoas, talvez, ainda preferiam tomar sorvete com pessoas e já não acreditavam mais na humanidade, é fato, mas não tinham a quem recorrer. Lembro-me do espanto que uma amiga bióloga causava ao desabafar que preferia seu animal peçonhento para estimar, do que um ser-humano. Tão moderna.
E os produtos deste universo já estão em toda parte. Invadiram prateleiras de hipermercados e têm displays até em açougues, aliás, uma piada interessantíssima do neuromarketing. Objetos tão coloridos e atraentes que, mesmo sem um pet em casa, dá vontade de comprar. Na sociedade da carência, as coisas são planejadas para os donos, não para seus animais.
Tive uma ideia mas, como todas as minhas ideias em sua concepção improdutiva, será realidade na conta bancária de outra pessoa. O grande lance é colher os estudos realizados com os animais em suas reações de imagem e som. Daí deve vir o primeiro canal de streaming media dedicado exclusivamente a animais… Ou gente que amarrará seu bichano no pé do sofá pra assistir junto