O Renascimento da Figura Feminina na Era da Inteligência Artificial

As mulheres dominavam o centro do universo espiritual, social e político. Agora é a vez da Siri, da Alexa e da Cortana. Quais os desafios da relação estética feminina na Inteligência Artificial?

Talvez você não saiba, mas as mulheres dominavam o centro do universo espiritual, social e político. E agora estou aqui na ideação de uma HRTECH que terá uma assistente pessoal e, logo de cara, pensei em lhe dar um nome feminino.

A Mulher na Antiguidade

Na antiguidade elas eram as Deusas, portadoras da vida capazes de dar à luz e os homens nem sabiam que tinham participação no processo. Como observa Gimbutas (1991), a antiga civilização matrifocal honrava as divindades femininas e reconhecia o poder criativo das mulheres.

De acordo com a pesquisadora, a construção do arquétipo da Deusa provedora da vida remonta às antigas civilizações pré-históricas, especialmente nas culturas neolíticas, que podem ir de 10.000 a.C. até 2.000 a.C..

A Inteligência Artificial é Uma Escrava do Século XXI e Você Não Quer Falar Sobre Isso

Na evolução da IA somos nós fazendo uma máquina à “nossa imagem e semelhança”, para fazer o “trabalho pesado” por nós. Qual o principal ativo econômico nessa relação?

A Inteligência Artificial é Uma Escrava do Século XXI e Você Não Quer Falar Sobre Isso Artigo de Alex Pinheiro

Entretanto, ainda na civilização inca, entre os séculos XIII e XVI d.C., portanto bem mais recente, a Pacha Mama era considerada a Mãe Terra, reverenciada como uma divindade feminina que representava a fertilidade, a abundância e a conexão espiritual com a natureza, subjugando poderosos como o imperador Pachacútec, e deixando muito “general de dez estrelas… com o cu na mão“.

Para de Blecourt (2017), esse domínio da figura feminina foi gradualmente substituído pela disseminação do medo e da desconfiança em relação aos mistérios das mulheres.

A figura estética da Deusa deu lugar à demonização do feminino, culminando na brutal perseguição das mulheres como bruxas durante a Idade Média, por exemplo. Como destaca Cavendish (1983), a Igreja viu nas mulheres um desafio ao seu poder e autoridade.

A Estética Feminina na Inteligência Artificial

Com a inteligência artificial ebulindo, está cada vez mais comum as assistentes pessoais administrando bilhões de dados e entregando sugestões e reflexões em linguagem natural para tudo quanto é desafio. Dia desses, por exemplo, testei a MaIA, uma assistente fashion consultora de moda, incorporada ao WhatsApp, que vai te dar ótimas dicas sobre o que vestir.

Fiquei pensando se o poder feminino não está encontrando um novo caminho para o centro do palco. É uma reviravolta irônica na qual a tecnologia, que muitas vezes foi vista como uma extensão do domínio masculino, esteja resgatando a feminilidade “perdida”.

A escolha não só de nomes femininos, mas também de personalidades femininas como a Siri, a Alexa e a Cortana, para assistentes pessoais de IA, é mais do que uma mera coincidência. Essa escolha ressoa com a história nos provocando a refletir sobre as raízes profundas do poder feminino e sua relação com a tecnologia moderna.

Como destaca Whitmont (1991), o renascimento da figura feminina na consciência coletiva pode ser um sinal de cura e renovação; um retorno à compreensão mais equilibrada e respeitosa das energias masculina e feminina.

No entanto, essa aparição da silhueta feminina na tecnologia trás desafios. A representação feminina na IA até pode ser uma vantagem estética, mas também suscita estereótipos de gênero e a perpetuação de padrões sociais prejudiciais, como o da “mãe”, que perdeu a divindade que dava à luz e se tornou a única responsável por dar banho, trocar a fralda suja e correr acudir a criança quando ela chora.

Afinal, o que significa para as mulheres serem reduzidas à meras assistentes virtuais? E cadê o empoderamento se a principal função da IA é servir à qualquer hora, ter resposta pra tudo e correr acudir quando você chora?

Além disso, a adoção desenfreada de tecnologias de IA, machine learning e interfaces humanoides traz consigo uma série de implicações éticas e morais. Quais são os limites da interação pessoa-máquina? Até que ponto devemos permitir que as tecnologias digitais influenciem e moldem nossas percepções de gênero e identidade?

À medida que navegamos por esse território desconhecido, é crucial manter um olhar crítico sobre o papel da IA na reconfiguração das relações de gênero também.

Vou procurar um nome neutro para a assistente pessoal do meu projeto.

Bibliografia:

  • Cavendish, R. (1983). The Black Arts. Nova York: Perigee Book.
  • de Blecourt, W. (2017). Witches on screen. In O. Davis (Ed.), The Oxford illustrated history of Witchcraft and Magic. Oxford: Oxford University Press.
  • Gimbutas, M. (1991). The Civilization of the Goddess: The World of Old Europe. Harper: San Francisco.
  • Whitmont, E. C. (1991). O retorno da Deusa. São Paulo: Summus.

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