Pegue o café e venha pra fofoca: estive semana passada em uma das minhas visitas técnicas a um cliente que é hotel fazenda — e não é qualquer um. Ele tem a aura romântica de quem começou como um pesqueiro raiz, ainda nos anos 90, quando pescar era uma desculpa honesta pra sair de casa.
Hotel fazenda desses com história, alma e barro na unha, ao longo dos anos o mercado foi empurrando o negócio para a transformação inevitável: mais estrutura, mais atrações, mais gente. E hoje, orgulhosamente, é um empreendimento turístico com experiências rurais autênticas, comida de roça e atrações que fariam qualquer criança da cidade esquecer o tablet.
Mas o curioso é que o hotel é conhecido mesmo por… sua piscina. Uma piscina grande, vistosa, que virou cartão-postal involuntário da marca. Sabe quando você senta na mesa e o garçom te coloca sob pressão para escolher a bebida e você responde rápido: “Pode ser Coca, então”. A Coca-Cola é o top of mind dos refrigerantes, assim como a piscina é o top of mind desse meu cliente.
Estive lá, observei o comportamento e voltei para te contar que tem uma galera achando que assistentes pessoais são só ferramentas que respondem perguntas. Mas você sabe conversar?
CONTINUAR LENDO...Aí entra a armadilha e, junto, o efeito psicológico que dá nome a este artigo. Não importa o passeio a cavalo, o tour de trenzinho puxado por um Troller, a boa gastronomia do campo, os belos lagos para contemplação, ou o zoológico caipira com animaizinhos dóceis soltos na fazenda. Na cabeça do freguês, é o “lugar da piscina grande pra gente ficar de boa!”.
No efeito da mera exposição (em inglês, mere exposure effect), teorizado pelo psicólogo Robert Zajonc em 1968, as pessoas tendem a desenvolver uma preferência por coisas simplesmente porque estão familiarizadas com elas. Mesmo que a exposição a esses estímulos seja de forma inconsciente, mínima ou irrelevante.
O termo “mera” é usado pois a exposição não precisa ser racional, nem compreendida, nem significativa. Basta que o objeto apareça com certa regularidade e frequência, mesmo que em segundo plano, para que comece a influenciar julgamentos afetivos e cognitivos.
Assim: quanto mais você vê, mais você gosta. Quanto mais você ouve, mais você aceita.
“🎶 Hoje é um novo dia, de um novo tempo que começou”. Conhece essa? Um exemplo clássico que se conectava afetuosamente com as pessoas antes da era da internet popular nos celulares.
E é por isso que marcas reforçam símbolos até virarem identidade.
Zajonc demonstrou o efeito da mera exposição por meio de experimentos em que as pessoas eram expostas repetidamente a estímulos visuais neutros como ideogramas chineses, rostos humanos ou palavras sem sentido e então as pessoas avaliavam esses estímulos como mais agradáveis do que outras imagens mostradas apenas uma vez ou não mostradas anteriormente. A grande sacada do estudo é que a familiaridade gera fluência cognitiva, e a fluência é interpretada subjetivamente como algo positivo, confiável e emocionalmente seguro. Isso significa que o cérebro humano tende a preferir o que já viu antes não por mérito do conteúdo, mas porque é reconhecível.
Portanto, a mera exposição se dá no nível inconsciente. As pessoas não param para formular conscientemente que “esse lugar tem piscina”, porque a associação é feita em nível automático, pré-reflexivo.
A mente processa imagens de forma associativa e contextual, e a repetição cria a ilusão de importância. Assim, o que começou como um destaque vira rótulo. Pois é aqui que mora o detalhe ignorado por quem lê Zajonc pela metade: o excesso de exposição não cria apenas familiaridade. Ele condiciona a percepção. E, no marketing, percepção é tudo!
Não é força de expressão. É neurociência. O cérebro humano adora atalhos, e um dos mais potentes é o da associação contextual. Kahneman (2011) explica isso em Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. A mente rápida capta sinais e monta um quebra-cabeça com base naquilo que já viu.
Se tudo o que uma mente vê sobre o seu negócio envolve sol, boia colorida e gritaria na água, ela não vai lembrar do passeio a cavalo no friozinho da manhã com pão de queijo artesanal.
Entendo que a piscina seja uma excelente atração e um ótimo negócio, pois os custos são baixos e amplia o markup de quem venha para o day use, mas reforçar isso o tempo todo cria um vínculo mental com o verão. E o verão… passa.
Outro psicólogo, o Jerome Bruner, estudou que a mente humana organiza a realidade a partir de categorias mentais.
Quando um estímulo é reforçado com frequência e em contexto similar, ele vira símbolo recorrente. Um ícone. E o ícone não aceita rivais. Se sua marca só cresce e aparece com calor, sol e cloro, ela vai ser interpretada como uma marca sazonal. Daí você vai investir muito em fazer a “festa do figo”, o melhor porco no rolete, a tirolesa que atravessa o lago, e os cambáu. Só que, se não souber trabalhar a comunicação, será sempre o “lugar da piscina grande pra gente ficar de boa!”.
Mais que mera exposição: estamos falando de associação contextual. O cérebro não trabalha com banco de dados analítico, ele opera com atalhos visuais e afetivos. A mente não analisa: “Ah, eles têm diversas atrações que eu nem sei por onde começar!”. Ela simplesmente conclui rápido: “Piscinaaaa!”.
Talvez você tenha começado a leitura achando que este artigo era sobre psicologia cognitiva, depois suspeitou que era sobre piscinas, e agora pode descobrir que é sobre as pragas das trends em redes sociais.
Veja: Essa compreensão mais profunda do efeito da mera exposição nos leva a uma conclusão muitas vezes ignorada: tudo o que você repete comunica, e tudo o que você comunica molda crença.
Ao longo dos anos, marcas constroem símbolos, percepções e significados por meio da repetição coerente de elementos visuais, experiências, valores e tom de voz. É por isso que uma empresa como a do meu cliente pode consolidar uma imagem poderosa e duradoura associada à piscina.
Não é que seja sua única entrega, mas porque foi o símbolo mais repetido. E o mesmo mecanismo que transforma uma piscina em ícone de marca também transforma conteúdos impulsivos em ruído de identidade quando empresas entram em trends desconectadas de sua essência.
O perigo não está apenas no ridículo pontual, mas na ruptura da fluência que o cérebro do consumidor vinha construindo. Algo que pode gerar dissonância cognitiva e perda de confiança, por exemplo.
O que deveria ser um crédito leve ao repertório de comunicação da marca vira um ponto de inflexão que confunde o público. O branding construído por exposição orgânica e consistente ao longo dos anos pode ser desfeito por 15 segundos de desespero performático em uma trend sem propósito.
Tem gente confundindo o que é engajamento de verdade. O vídeo pode viralizar, mas a credibilidade pode evaporar.
Conhecendo o efeito da mera exposição, fica impossível ignorar que cada aparição pública, cada conteúdo compartilhado, cada vídeo publicado é uma peça simbólica que reforça ou redireciona a imagem da sua empresa.
Quando você participa de uma trend, você não está só “entrando na brincadeira”: está comunicando linguagem, valores, crenças e o tipo de relação que deseja manter com as pessoas. E isso tudo é absorvido de forma subjetiva, silenciosa e automática. Em outras palavras: o mesmo cérebro que aprendeu a amar sua marca por repetição, pode começar a estranhar (ou rejeitar) quando você tenta comunicar algo que destoa daquilo que já vinha mostrando.
Claro que há exceções de sucesso e são exceções justamente porque respeitam o contexto da marca. O trabalho da “Pref’s” de Curitiba nas redes sociais em 2013, por exemplo, virou case pioneiro em linguagem das redes para comunicação pública com estratégia, timing e identidade. É que não estavam apenas querendo viralizar, estavam criando diálogo.
Resumindo, dá para se vender mais assertivamente e menos impulsivamente. É para isso que estudamos comportamento.
E já que o hype da novela Beleza Fatal foi um sucesso de marketing, cabe a provocação: Você faria sua lipoaspiração com um cirurgião plástico que tem uma imagem sóbria nas redes, diversos posts mostrando sua participação em fóruns especialistas, vídeos técnicos e com boa iluminação? Ou escolheria fazer com o Dr Peitão? É sobre isso, no fim do dia… O que te inspira autoridade, credibilidade e confiança.
Algumas sugestões práticas para você não cair na armadilha da exposição perigosa:
O efeito da mera exposição não é só um truque de publicidade. É uma lente de leitura do mundo. E você pode usá-la com inteligência para reforçar o que constrói ou ficar preso na repetição de um ícone que já não tem aderência com seu desejo de faturar o ano inteiro. Então, a receita do sucesso é comunicar com estratégia, disciplina e diagnóstico ágil das armadilhas do caminho.
Têm até pseudo-intelectuais que defendem adaptar a linguagem da sua marca para o idioma contemporâneo digital, mas só evangelizam o “auê”… quem paga a conta é você.
Alex Pinheiro é artista, apresentador, e profissional para inteligência de mercado e presença de marca.
É pós-graduado em Digital Business (USP), graduado em Eventos no Centro Universitário N. Sra do Patrocínio, e Técnico em Turismo pelo Centro Paula Souza.
Atua com mentoria estratégica, gestão de tráfego na internet e arquitetura de negócios.
BRUNER, Jerome S. Atos de significado. Tradução de Ivonilde Dias da Silva. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.
KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Tradução de Cássio de Arantes Leite. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.
SILVA, Jéssica D. Bem-vindo ao Facebook da Prefs: A inserção da FanPage da Prefeitura de Curitiba no âmbito da comunicação pública. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Comunicação Social – Jornalismo) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/188640. Acesso em: 9 abr. 2025.
ZAJONC, Robert B. Attitudinal effects of mere exposure. Journal of Personality and Social Psychology, v. 9, n. 2, p. 1–27, 1968. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/224982289_The_Attitudinal_Effects_of_Mere_Exposure. Acesso em: 9 abr. 2025.